terça-feira, 1 de junho de 2010

Quando Nietzsche Chorou


“- Um homem profundo precisa de amigos – começou ele, como se falasse mais para si do que para Breuer. – Se todo o resto falhar, sobrarão seus deuses. Mas eu não tenho amigos nem deuses. Eu, como você, tenho desejos e meu maior desejo é a amizade perfeita, uma amizade inter pares, entre iguais. Que palavras inebriantes, inter pares, palavras com tanto conforto e esperança para alguém como eu que sempre viveu só, que sempre procurou mas nunca encontrou sua outra metade. Às vezes, tenho me desabafado através de cartas para minha irmã, para amigos. Mas, quando encontro as pessoas face a face, sinto-me envergonhado e dou as costas.
- Exatamente como está dando as costas para mim agora? – interrompeu Breuer.
- Sim – e Nietzsche quedou-se emudecido.
- Tem algo para desabafar agora, Friedrich?
Nietzsche, ainda espiando pela janela, acenou positivamente com a cabeça:
- Nas raras ocasiões em que não consegui agüentar a solidão e dei vazão a explosões públicas de lamento, odiei-me uma hora depois e me senti um estranho em relação a mim mesmo, como se tivesse perdido minha própria companhia. Também nunca permiti aos outros se desabafarem comigo… eu não estava disposto a assumir a dívida da reciprocidade. Evitei tudo isso… até o dia, é claro – voltou o rosto para Breuer – em que demos as mãos e concordamos com nosso estranho contrato. Você é a primeira pessoa com quem sempre mantive o rumo. E mesmo com você, de início, esperei traição.”


Irvin D. Yalom
Quando Nietzsche chorou

Nenhum comentário:

Postar um comentário